segunda-feira, 4 de março de 2024

Na primeira instância

Entre ventos e sóis

Lá instava eu

Comendo palavras e instantes 

Gostava das coisas em seu estado esvoaçante

Alçando vôo sobre si.

Hoje equipada de abismos

Assisto escuros, escuto silêncios

Como filme projetado no córtex frontal.

Estou de me embriagar de apatia

As vezes só me resta a química

Percorrendo meus ventres sem saídas

E as intercorrências construindo partidas.


(GB - 24)


quinta-feira, 20 de janeiro de 2022

Corpo caloso
Inter-hemisférica
Direta indireta
Direita esquerda
Ânima ânimus
Complementária
Lua Sol
Cono falo
Mar lago
Vulcão tempestade
Caçador jardineira
Genitor genetriz
Terra céu
Barca vela
Taça pirâmide
Vênus marte
Yin Yang
Água seca
Fornilho tubo
Semente adubo
Cria ação
Tese e antítese:
Toda criação vem da contradição
E a percepção também.

(GB - 23)

Apesar de você

Foi quando o desenho aquarelado 
Que o sol pintou na areia molhada
Com as luzes do céu-mar
Formando o tal do beijo azul
Rosa, amarelo, laranja
Arco-íris,
O primeiro beijo do ano 22,
Nasceu a epifania:
Há vida!

Nasce
Apesar de
Nasce da lama
Do caos
Do barro
Dos orifícios
Dos buracos
Dos cantinhos
Dos caminhos
Dos concretos
Surge
Pulsa
Em todos os seus ruídos

É bicho
É gente
É urgente
Um tanto ameaçada
Mas sempre emergente
Resistente
Avassaladora

Vibra
Apesar de tudo 
A vida ainda vibra!
Em cada aresta
Em cada fresta
Em cada passarinho
Em cada amanhecer
Em cada anoitecer
Em casa entardecer
Em cada ser.

Um pedido:
Que as mortes sirvam de alimento
À vida faminta
Nesse momento 
E o caos reorganize
Cada fragmento
De alma devastada.

(GB - 23)

Improviso em papel surpresa

Vento que venta minha ventania
Como cortinas meu estômago revira
Aos olhos teus a faiscar-se
Centelha dou da faísca à pele
Que pelos pelos ateia brasa
A ao ar quente viro fumaça
Que habita o peito nas manhãs de verão
A boca molha
A pele enrola
E tu amola minha visão

(GB - 23)

Abre

Vontade latente nos dias
Que aparece súbita
Insana
Voraz
Rápida 
Mas se demora:
Um abraço,
Só um abraço
Pra sentir pelo toque,
Meu corpo,
E o senso de humanidade.
O outro como medida
Das minhas periferias,
Mas não dos meus limites.
Abraço não limita,
Abre alguma coisa aqui dentro,
Que preciso pra sentir que vivo.

(GB - 23)

Em Or/ação

Quero me dar de presente
Um doar-me inteira pro presente
Uma foto com os olhos
uma captura em suspensão.

Assim, algumas palavras espiam a mente
jogando no verbo o que está apodrecido.
O ar, enchendo o corpo, o esvazia
de tudo o que não for
Tudo o que é: eu e hoje e o vento
O resto não é

Um sussurro claro do tempo
Que só diz coisas de agora
Eu é que teimo em ouvir passado
Ou ver projeção
Assim aprendo a dirigir a expectativa
Que é veículo que move
Ou atropela quem o próprio conduz

Tempo me ensine a ser pó
Pó estelar
Tempo não quero ter dó
Dó de ficar
Em mim
Tempo eu tô aqui
Como poderia não estar
Se você me embala?

Tempo não quero ansiar
Nem desesperar
Quando não te olho em mim
Sinto que não tenho lar
Tu me trouxe aqui
Passageira de mim
De tempo em tempo
Fico a te admirar
Haja tempo pro tempo abraçar
Tu que me deu de presente
O presente estar
Não quero mais apressar

O que me ajudou a criar
Quero te entregar
Assim estou a me recriar
A cada hora que a vida me revirar
Instantes, fragmentos, fagulhas
Tua calma divina e não linear
Me ensina a só ser
Ao compasso de não precisar
Ser nada

(GB - 23)

Amorecer

Quero amor que não custa
Mas que pede, gentil, pra ficar.
Que pouse aos poucos como pôr-do-sol,
Que arrepie leve como brisa de verão.
Que é gostoso,
Que é quentinho,
Que é refrescante.
Te quero leve em mim.
Que me leve.
Aquele amor que se demora.
Amor onde se perde a noção do tempo,
Que siga a não linearidade,
Que não quebre expectativas,
Nem quero expectativas.
Quero amor que é
Onde como tem que ser.
Amor que aparece quando quer
Porque é quando deve
E que quando some, ainda tá aqui.
Não quero amor viciado,
Amar desesperado,
Não quero amor que me engula,
Mas que eu engula.
A degustar,
Com calma agridoce.
Quero amanhecer em amor
Quero amorecer.

(GB - 23)